RECOMENDAÇÃO À SAÚDE: Defensoria dá prazo para a anulação do resultado final do Processo Seletivo da SESAU

 

Ofício nº 260/2020/GAED/DPG

RECOMENDAÇÃO GAED/DPE/RR Nº 01/2020

 

A Sua Excelência o Senhor

Governador do Estado de Roraima Antonio Denarium

Governo do Estado de Roraima

Av. Terêncio Lima, 1, Centro, 

Boa Vista/RR, CEP: 69301-100.

 

A Sua Excelência o Senhor

Secretário de Estado da Saúde Allan Quadros Garcês

Secretaria de Estado da Saúde de Roraima

Rua Madri - nº 180 - Campus do Paricarana,

Bairro Aeroporto - CEP: 609043-270.

 

 

Considerando que a Constituição Federal, em seu artigo 134, caput, aduz que a “A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal”. 

 

Considerando que a Constituição Federal prevê que “é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI” (artigo 37, inciso XVI) e “a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas” (artigo 37, inciso XVI, alínea “c”).

 

Considerando que a Lei Complementar Federal n. 80/1994, em seu artigo 4º, estabelece diversas funções institucionais da Defensoria Pública, dentre elas “a afirmação do Estado Democrático de Direito” (inciso II) e “ promover a mais ampla defesa dos direitos fundamentais dos necessitados, abrangendo seus direitos individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e ambientais, sendo admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela” (inciso X).

 

Considerando que a Lei Complementar Estadual n. 164/2010 institui que “A Defensoria Pública do Estado é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal” (artigo 2º, caput) e que é função institucional desse órgão “promover, prioritariamente, a solução extrajudicial dos litígios, visando a composição entre as pessoas em conflito de interesses, por meio de mediação, conciliação, arbitragem e demais técnicas de composição e administração de conflitos” (artigo 6º, inciso II).

 

Considerando que o Código de Processo Civil, em seu artigo 3º, estabelece que “ O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos” (parágrafo 2º) e “A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial” (parágrafo 3º).

 

Considerando que o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que norma infraconstitucional não pode limitar a acumulação de cargos públicos de forma não prevista na Constituição Federal:

 

E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO – ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS – PROFISSIONAIS DA ÁREA DE SAÚDE – LIMITAÇÃO DA JORNADA SEMANAL A 60 (SESSENTA) HORAS POR NORMA INFRACONSTITUCIONAL – REQUISITO NÃO PREVISTO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – INVIABILIDADE DA RESTRIÇÃO COM BASE UNICAMENTE NESSE CRITÉRIO, DEVENDO AVERIGUAR-SE A COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS – AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.(RE 1023290 AgR-segundo, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 06/10/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-251 DIVULG 31-10-2017 PUBLIC 06-11-2017).

 

Considerando que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n. 1767955/RJ (Rel. Ministro OG FERNANDES, Primeira Seção, julgado em 27/03/2019, DJe 03/04/2019), posicionou-se nos seguintes termos:

 

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS REMUNERADOS. ÁREA DA SAÚDE. LIMITAÇÃO DA CARGA HORÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. REQUISITO ÚNICO. AFERIÇÃO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRECEDENTES DO STF. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. A Primeira Seção desta Corte Superior tem reconhecido a impossibilidade de acumulação remunerada de cargos ou empregos públicos privativos de profissionais da área de saúde quando a jornada de trabalho for superior a 60 (sessenta) horas semanais.

2. Contudo, ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal, reiteradamente, posicionam-se "[...] no sentido de que a acumulação de cargos públicos de profissionais da área de saúde, prevista no art. 37, XVI, da CF/88, não se sujeita ao limite de 60 horas semanais previsto em norma infraconstitucional, pois inexiste tal requisito na Constituição Federal" (RE 1.094.802 AgR, Relator Min. Alexandre de Moraes, Primeira Turma, julgado em 11/5/2018, DJe 24/5/2018).

3. Segundo a orientação da Corte Maior, o único requisito estabelecido para a acumulação é a compatibilidade de horários no exercício das funções, cujo cumprimento deverá ser aferido pela administração pública. Precedentes do STF.

4. Adequação do entendimento da Primeira Seção desta Corte ao posicionamento consolidado no Supremo Tribunal Federal sobre o tema.

5. Recurso especial a que se nega provimento. 

 

Considerando que o Tribunal de Justiça do Estado de Roraima já se posicionou nesse sentido:

 

RECURSO ADMINISTRATIVO - CUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS  AUTORIZADA PELO ART. 37, XVI, b DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - PROFESSORA E PSICÓLOGA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA - INEXISTÊNCIA DE SOBREPOSIÇÃO DE HORÁRIOS E DE JORNADA EXTENUANTE AO SERVIDOR - LIMITAÇÃO DA CARGA HORÁRIA - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO PROVIDO.

A construção jurisprudencial de limitação da jornada de trabalho a 60 (sessenta) horas semanais deve ser aplicada conforme o caso concreto, cabendo ao julgador impedir o acúmulo nos casos em que esse revela uma exposição a jornada de trabalho extenuante a ponte de comprometer a eficiência do serviço público, o que não se observa na hipótese.

Impedir que a servidora exerça, em horários distintos,  o cargo de psicóloga nesta Corte de Justiça e de professora na Universidade Estadual de Roraima seria criar verdadeiro obstáculo ao exercício de direito constitucionalmente protegido.

(TJRR – RA 0000.16.001552-5, Rel. Des. JEFFERSON FERNANDES DA SILVA, Tribunal Pleno, julg.: 21/11/2018, public.: 29/11/2018, p. 03)

 

Considerando que os elementos de informações angariados pelo Grupo de Atuação Especial da Defensoria Pública do Estado de Roraima (processo sei n. 000358/2020) apontam que candidatos(as) participantes do Processo Seletivo Simplificado para a Contratação Temporária de Profissionais da área de Saúde no âmbito da Secretaria de Estado da Saúde foram equivocadamente eliminados por possível acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas.

 

Considerando que o modelo de declaração de não acumulação de cargos públicos, disposto no anexo VII, do edital de abertura do Processo Seletivo Simplificado para a Contratação Temporária de Profissionais da área de Saúde (EDITAL/SESAU/GAB/RR Nº. 001/2019), não traz nenhuma ressalva acerca da possibilidade de acumulação remunerada de dois cargos públicos privativos de profissionais da saúde quando há compatibilidade de horários no exercício das funções.

 

Considerando que o item 2.2 do edital de abertura do certame estabelece que “Os candidatos que declararem falsamente não possuir cargo público terão seus nomes encaminhados ao Ministério Público Estadual, para que seja oferecida denúncia pelo crime de falsidade ideológica, com base no caput do Art. 299 do Código Penal Brasileiro”.

 

Considerando que o padrão de declaração de não acumulação de cargos públicos disponível no edital de abertura, associado a previsão genérica de encaminhamento dos nomes daqueles que eventualmente não declararem ocuparem cargo público – sem qualquer ressalva –, tolhe, a um só tempo, o direito do candidato de prosseguir no certame e o direito/dever da administração pública estadual de analisar caso a caso compatibilidade de horários a que se refere o dispositivo constitucional, na hipótese de aprovação e convocação. 

 

Considerando que aparentemente o edital de abertura (EDITAL/SESAU/GAB/RR Nº. 001/2019) e a portaria que publicou o resultado final do certamente (PORTARIA No 0071 - SESAU/2020), ao desclassificarem de plano alguns candidatos, não observaram o pressuposto lógico-jurídico – compatibilidade de horários – e o pressuposto jurídico – incidência de uma das exceções previstas no art. 37, XVI, da Constituição da República – que autorizam a acumulação de cargos.

 

Considerando que é inválido qualquer ato administrativo que restrinja, de forma genérica e abstrata, sem a análise do caso concreto, a possibilidade de acumulação remunerada de cargos públicos fora das hipóteses constitucionalmente previstas.

 

Por fim, considerando que os atos emanados pelas autoridades administrativas devem pautar-se pelo princípio da legalidade, segundo o qual, ao administrador somente é dado realizar o que estiver previsto na lei (artigo 37, caput, Constituição Federal).

 

O Grupo de Atuação Especial da Defensoria Pública do Estado de Roraima (GAED) resolve recomendar ao Excelentíssimo Senhor Governador do Estado de Roraima e ao Excelentíssimo Senhor Secretário Estadual de Saúde de Roraima, com viés preventivo e cooperativo, visando a resolução extrajudicial (artigos 5º e 6º do Código de Processo Civil), o seguinte:

 

Artigo 1º. A anulação da PORTARIA Nº 0071 - SESAU/2020, que publicou o resultado final do Processo Seletivo Simplificado para a Contratação Temporária de Profissionais da área de Saúde, desclassificando candidatos(as) sem a observância das hipóteses de acumulação lícita de cargos públicos constitucionalmente previstas.

 

Artigo 2º. Abster-se de exigir a declaração de não acumulação de cargos públicos disponível no edital de abertura, nos casos em que a Constituição Federal autoriza a acumulação remunerada de cargos.

 

Por fim, dada a necessidade imediata em se assegurar o prosseguimento dos(as) candidatos(as) nas demais etapas do referido processo seletivo, oferta-se prazo de 5 (cinco) dias para o cumprimento da presente recomendação expedida pela Defensoria Pública do Estado de Roraima, sendo que eventual descumprimento por parte da Administração Pública Estadual pode acarretar eventual ajuizamento de ação civil pública.

 

Registre-se no sistema interno de controle do GAED. 

 

Encaminhem-se cópias à Procuradoria-Geral do Estado de Roraima, ao Governo do Estado de Roraima e à Secretaria de Saúde do Estado de Roraima, devendo a presente ser entregue pessoalmente às autoridades que representam as referidas instituições. 

 

Publique-se no sítio eletrônico da Defensoria Pública do Estado de Roraima e no Diário Oficial do Estado.

 

Sem mais para o momento, colocam-se os membros subscritores à disposição para maiores esclarecimentos e informações.

 

Boa Vista, 13 de fevereiro de 2020.

 

FREDERICO CESAR LEÃO ENCARNAÇÃO

Defensor Público

 

PAULA REGINA PINHEIRO CASTRO LIMA

Defensora Pública

 
Top